Humberto Delboni
Filho nasceu em 22 de janeiro de 1934, na cidade de São José do Rio Preto,
então chamada apenas de Rio Preto, no estado de São Paulo.
Informou o Prof.
Delboni, em relato feito ao CeHFi (Centro de História e Filosofia das Ciências
da Saúde da EPM-Unifesp) que faz parte de uma terceira geração de imigrantes
italianos. Seu pai era um farmacêutico formado em 1911 pela Escola de Farmácia,
Odontologia e Obstetrícia de São Paulo. Lembrou que seu pai tinha cultura e boa
reputação, e, naquela época, eventualmente substituía o médico. Aos dez anos de
idade, Delboni já fazia uma espécie de papel de “secretário” de seu pai. Tinham
uma pequena biblioteca, da qual ele, mais especificamente, destacou e conservou
o “Formulário e Guia Médico”, de Pedro Luiz Napoleão Chernoviz, 18ª edição, de
1908.
Este livro, que
também era chamado por alguns de “Chernovitz”, foi citado por autores
literários dos séculos XIX e XX e era uma espécie de Manual Geral de medicina,
do qual se serviam médicos e outros profissionais, com um caráter, até certo
ponto, um tanto mítico, até mesmo com estudos sobre o seu papel na sociedade de
então.
O pai do Dr.
Delboni sempre o fazia consultar o Chernoviz para saber coisas as mais variadas.
Seu irmão, Valyrio Luiz Delboni, que se formou pela Escola Paulista de Medicina
EPM} em 1950, serviu de estímulo para cursar a medicina.
Em 1952, Delboni
ingressou na EPM. No segundo ano, o
Chefe do Laboratório Central do Hospital São Paulo (HSP) era o Prof. João
Marques de Castro. Ele oferecia estágio aos alunos do segundo ano no
Laboratório. Tratava-se de um estágio que não conflitava com o horário curricular.
O número de vagas era limitado e o Prof. Castro dava preferência aos alunos que
não tivessem ficado de segunda época no ano anterior, embora comentasse que
esse critério teria suas limitações.
O Prof. Delboni
acentuou que o estágio era muito rigoroso, usando a palavra “germânico” para frisar
seu rigor. Havia horários a serem cumpridos mesmo às cinco da tarde de sábado.
O Prof. João ia para o anfiteatro do segundo andar cinco minutos antes das
dezessete horas, acompanhado do assistente mais graduado. Eventualmente, um
grupo de alunos no corredor decidia descer para tomar “um cafezinho”. Às dezessete
horas o Prof. João pedia ao assistente que fechasse a porta. Os alunos que
voltavam do café ficavam do lado de fora, olhando no visor da porta, e acabavam
ficando sem o estágio.
Um professor que
tinha atitude com semelhante rigor em relação a horário e o fechamento da porta
nas aulas era o Prof. Afiz Sadi, chefe da Disciplina de Urologia.
No final do estágio
do Laboratório, o Dr. João (como era chamado pelos alunos) convidava a todos os
28 alunos para uma foto no pátio da EPM.
No dia da foto do grupo de Delboni, este esqueceu desse compromisso e foi ao
cinema. Depois contou esse fato ao Dr. João, que, de qualquer forma, o convidou
para iniciar um trabalho de Monitor. Portanto, no início do terceiro ano,
Delboni foi nomeado pela Congregação da EPM como Monitor do Laboratório Central
do HSP. O trabalho era rigoroso. O Laboratório pertencia à Primeira Cadeira de
Clínica Médica chefiada pelo Prof. Jairo Ramos.
Lembrou, então, o
Dr. Delboni que Jairo Ramos deu impulso à Clínica Médica, de modo que ela se
tornou padrão de referência na América Latina. Muitos se espantavam que Delboni
conseguia trabalhar com o Dr. João, homem de poucas palavras e temperamento de
difícil trato. Delboni guardou na memória quanto ganhava na época como Monitor,
o equivalente ao preço de um disco “long play” de 12 polegadas, que mal dava
para um sanduíche diário.
Em 1957, Delboni se
formou e continuou no Laboratório Central. Quando Dr. João faleceu, em 1960, Delboni
era o segundo na hierarquia, de modo que assumiu a chefia e assim seguiu, até
se aposentar em 1986 como professor da EPM.
Ele relatou,
então, toda sua labuta nos vários anos de transformação da medicina, do HSP e
do Laboratório, com dificuldades diversas, por vezes dando plantões, ou ajudando
algum professor a resolver algum caso específico.
Deu aulas de
Patologia, referente ao Laboratório, para alunos do terceiro ano. Saudou com
muita alegria a expansão da EPM. Ressalve-se o bom humor do Prof. Delboni, sempre
presente, e carregando no bolso superior do avental canetas de várias cores,
característica essa sempre lembrada por seus ex-alunos.
Referiu ele que o
Dr. João era a pessoa com mais cultura enciclopédica e humanística que conheceu,
e que era alguém que não tinha vida fácil, pois conviveu com uma nefrostomia
bilateral dos 23 aos 46 anos. O Dr. Delboni tornou-se chefe do Laboratório Central
com 26 ou 27 anos, de modo que era considerado “o menino do colegiado”, convivendo
com professores nas chefias com mais de 50 anos de idade.
O Prof. Delboni
acentuou que sempre procurou ser ponderado, respeitoso e humano, sem ser
condescendente com coisas erradas. Sempre foi grato à Escola Paulista de Medicina.
Prof. Dr. Humberto
Delboni Filho faleceu em 8 de outubro de 2019, aos 85 anos.
Fontes bibliográficas:
Acervo de Histórias de Vida (História Oral) do CeHFi – Centro
de História e Filosofia das Ciências da Saúde da EPM-Unifesp. Acessível em https://cehfi.unifesp.br
Acervo do jornal Folha de São Paulo. Acessível em
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/11/mortes-medico-transformou-a-patologia-em-sonho-realizado.shtml?origin=folha
A Mística do Parentesco. Acessível em https://parentesco.com.br