sábado, 22 de outubro de 2016

Biografia de Lemos Torres


      Álvaro de Lemos Torres nasceu em 15 de abril de 1884 na cidade do Rio de Janeiro. Era filho de João Pereira de Lemos Torres e de Ermelinda Lousada Torres. Fez o Curso de Humanidades no Colégio Pedro II, então chamado Ginásio Nacional, onde se bacharelou em Ciências e Letras em 1902. A partir de concessão legal, em março de 1903 fez exame para uma vaga no segundo ano do Curso de Medicina da Faculdade do Rio de Janeiro, tendo sido aprovado. Assim, foi possível terminar seu curso em 1907[1].
     Como estudante, entre 1904 e 1907, foi interno de Clínica Médica do professor Rocha Faria.
     De 1908 a 1913 trabalhou em Avaré, no interior do Estado de São Paulo, onde foi Diretor Clínico da Santa Casa, prestando serviços nesse estabelecimento sem qualquer remuneração. Ainda em 1908 foi nomeado médico da Estrada de Ferro Sorocabana, da qual se demitiu em 13 de fevereiro de 1916.
     Em 1912, grassava em certas regiões do Estado de São Paulo uma forma epidêmica paravariólica identificada por Emílio Ribas como sendo uma forma de “alastrim” ou “milk pox”.  Torres foi indicado para debelar essa doença em Avaré. Dessa ação, resultou sua indicação por Emílio Ribas para dirigir o Posto da Comissão de Tracoma em Descalvado. No entanto, declinou desse convite[2].
     Em 1913, ao se apresentar ao Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho, dizendo que queria fazer parte do corpo docente da Faculdade, ouviu do prof. Arnaldo: “Entre para um laboratório, trabalhe e mostre do que o senhor é capaz”[3]. Assim, entrou como assistente voluntário no Laboratório de Anatomia do Prof. Alfonso Bovero.
     Em 1914 também fez o serviço de preparador voluntário do setor de Parasitologia da Faculdade de Medicina de S. P.
     Em 18 de maio de 1914 substituiu interinamente o Dr. Dorival Camargo Penteado, assistente do Butantã. Nessa ocasião foi encarregado da Sorologia Anti-ofídica e da classificação das peças do Museu relativas à Parasitologia.
     Em 1915 foi também preparador voluntário do setor de Histologia da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo.
     Em 1916 entrou para o ensino médico como primeiro assistente do prof. Rubião Meira (Primeira Cadeira de Clínica Médica da Faculdade de Medicina), na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Mais tarde, chefiou a Segunda Enfermaria de Medicina, onde exerceu a investigação e o ensino de maneira mais plena.
     Na gripe de 1918 dirigiu o hospital do Mackenzie College, criado e mantido pela União dos Pastores Evangélicos de S. Paulo, tendo como auxiliares os médicos da Comissão Rockfeller, professor Darling, Dr. Hydriche e Dr. W. Smillie. Sua ação, nessa ocasião, foi bastante elogiada pelo Dr. Artur Neiva, Diretor do Serviço Sanitário da Capital[4].
     Em 9 de fevereiro de 1919, por proposta do Diretor Clinico da Santa Casa de Misericórdia de S. Paulo, Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho, foi nomeado Chefe da Quinta Enfermaria de Homens e Mulheres desse estabelecimento.
     De 1919 a 1921 esteve nos Estados Unidos com uma bolsa da Fundação Rockfeller de onde trouxe os fundamentos de eletrocardiografia.
     Em 1932, o Dr. Sinésio Rangel Pestana, então Diretor dos Hospitais da Santa Casa de S. Paulo, nomeou Lemos Torres para a Diretoria do Hospital São Luís Gonzaga, em Jaçanã.
     Lemos Torres criou o primeiro serviço de atendimento pré-natal em São Paulo, a pedido do Dr. Silvio Maia, diretor da Maternidade de S. Paulo e professor de Clínica Obstétrica. Torres atendeu a mesma solicitação feita pelo professor Raul Briquet na Faculdade de Medicina, quando este substituiu o Dr. Silvio Maia[5].
     Em 1933 participou da fundação da Escola Paulista de Medicina, cujo primeiro diretor foi o Dr. Octavio de Carvalho (que foi sucedido por Lemos Torres).
     Em 1934 foi eleito para o cargo de Presidente da Seção de Tisiologia da Associação Paulista de Medicina. Em 1936, por decreto do Presidente da República, foi nomeado como representante oficial do Brasil nos Congressos de Medicina Esportiva de Berlim e de Moléstias Internas de Wissbaden.
     Em 1938 assumiu a Diretoria da Escola Paulista de Medicina, função que exercia quando de sua morte em 18 de janeiro de 1942. O professor Lemos Torres fazia uma cavalgada pela Sociedade Hípica, na companhia do embaixador José Carlos de Macedo Soares, quando o cavalo tropeçou subitamente, levando o professor ao solo. Desta queda veio a falecer.  
    Era pessoa carismática que atraiu muitos discípulos e seguidores tanto na Faculdade de Medicina de S. Paulo como na Escola Paulista de Medicina, onde se tornou figura emblemática e fundamental para essa instituição tal como foi Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho para a Faculdade.
     Conforme texto do Prof. Dr. José Inácio Lobo, escrito para o livro comemorativo dos quarenta anos de fundação da Escola Paulista de Medicina[6]:
     “Lemos Torres foi um espírito eminentemente objetivo, que, no julgamento dos fatos, não se deixava dominar por preconceitos ou por motivos emocionais. Refutava as afirmações que entendia errôneas com a mesma sinceridade e com a mesma firmeza com que aceitava as objeções que lhe pareciam justas. O rigor da crítica por vezes desagradava o contendor, mas, a absoluta probidade mental com que exercia lhe grangeou o respeito e admiração dos seus discípulos e colegas”.
      Ainda conforme o Prof. Lobo, Lemos Torres “sempre deu extraordinária importância ao exame físico meticuloso do paciente, seguido de uma análise imparcial e ordenada dos dados colhidos”. Por isso, segundo o professor, ele também sempre se rebelou contra o conceito de “intuição clínica”, que dispensaria o ato de examinar bem o paciente e que ele considerava “uma espécie de impressionismo”.
     Ele também criticava o conceito de “entidade nosográfica”, como se a doença tivesse uma existência por si própria. Para ele o importante era considerar “o doente, sujeito a inúmeras e variadas influências e o diagnóstico será assim apenas a denominação a dar ao resultado dum exame concreto, muito embora não se ajuste exatamente a modelos pré-estabelecidos”.
     Assim, “ele infundia essas ideias em seus discípulos, além de estimular o espírito de crítica, o hábito da análise e o cumprimento dos deveres”.
     No Hospital de Tuberculose do Jaçanã, onde foi o primeiro Diretor, estabeleceu “um sistema de reuniões regulares para discussão de casos clínicos, avaliação dos dados evolutivos e estudo da literatura especializada”. Desse modo, “tornou-se o Hospital do Jaçanã uma verdadeira escola de Tisiologia em São Paulo”.
     “Esteve várias vezes nos Estados Unidos, inclusive como bolsista da Fundação Rockfeller, e mais tarde, na Europa, estagiando nos principais serviços de Cardiologia e Clínica Médica. Dentre os grandes nomes da medicina estrangeira com que efetivamente estudou e trabalhou há de citar-se os de White, Levine e Wilson nos Estados Unidos, o de Lewis na Inglaterra, e mais tarde, o de Volhard e Becker na Alemanha”.
     “Sem contar numerosos estudos pessoais sobre os assuntos de sua preferência, há que assinalar a descoberta que fez dum novo sinal de derrame pleural, que recebeu a designação de sinal de Lemos Torres”.
     “A sua objetividade, o seu rigor no julgamento não o impediam de ser, como de fato foi, um verdadeiro esteta, pois além de apreciador das artes, se dedicava à escultura, com resultados plásticos de invejável requinte”.  
     No dizer do Prof. Lobo, Lemos Torres foi o primeiro médico especializado em Cardiologia em nosso meio.  
     Com a criação da Escola Paulista de Medicina foi unanimemente escolhido para reger a Cadeira de Clínica Médica. Foi Diretor da mesma Escola de 1938 até sua morte em 1942.


[1] Arquivos do jornal “O Estado de São Paulo”: edição de 19 de janeiro de 1942.
[2] Idem.
[3] Silva, M. R. B. – Estratégias da Ciência: a História da Escola Paulista de Medicina (1933-1956). EDUSF, 2003.
[4] Arquivos do jornal “O Estado de São Paulo”: edição de 20 de fevereiro de 1942.  
[5][5] Idem.
[6] Lobo, J. I. in “A Escola Paulista de Medicina – dados comemorativos de seu 40º aniversário (1933-1973) e anotações recentes.” José Ribeiro do Valle. Empresa Gráfica da Revista dos Tribunais, 1977, pgs. 20-23. 

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