Baseada em texto de Renato de Toledo
“Archimede de
Busacca, o imprevisível”. Com esse título, Sylvio Abreu Fialho relembrou a figura
deste cientista que foi, também, um dos fundadores da Escola Paulista de
Medicina.
Imprevisível sim.
Seu gênio difícil, habitualmente áspero, ríspido e mordaz na apreciação de
pessoas e de coisas, deixando, apenas de quando em quando, transparecer seu
fundo de bondade, criou mais antipatias e inimizades do que estima entre os
oftalmologistas de São Paulo, que não o conheceram de perto.
Talvez por isso tenha
permanecido tão pouco entre os professores da EPM. Fundador, como os demais,
deveria reger a Cadeira de Histologia até que chegasse a oportunidade da
instalação da oftalmologia, para a qual se transferiria. Tal não aconteceu. No
entanto, nunca foi negado o reconhecimento ao saber de Busacca. No Brasil e em
outros países seus trabalhos foram citados e constaram entre os clássicos da
oftalmologia universal.
Pesquisador, muito
mais clínico do que cirurgião, atividades para as quais não tinha paciência ou
dom, desenvolveu a biomicroscopia ocular relacionando-a aos achados
histopatológicos, como poucos fizeram.
Essa sua
predileção pela patologia oftalmológica veio desde sua formação universitária.
Quando cursava o 2º ano de medicina, com 18 anos de idade, era já interno do
Instituto Anatômico de Palermo, pa ssando posteriormente a Assistente, onde
ficou até 1920. Em 1921 passou a Adjunto do Instituto de Patologia Geral de
Palermo, quando se transferiu para a oftalmologia, ocupando o cargo de
assistente nas Faculdades de Cagliari, Turim, Bolonha e Florença.
Em 1926 fez
concurso para Livre Docente em Oftalmologia em Florença, quando já apresentava
relação de 33 publicações, a maioria sobre histologia, fisiopatologia e clínica
oftalmológicas.
Em 1928,
transfere-se para São Paulo, revalidando seu diploma na então Faculdade
Nacional de Medicina. Sua produção científica continua ininterrupta e com o
mesmo ritmo, até março de 1971, quando faleceu, constando de seu currículo a
relação de 155 trabalhos publicados em periódicos, além de 4 livros, um deles
em 3 volumes, sobre biomicroscopia ocular. Praticamente nada publicou em
português. Seus trabalhos figuram nas revistas alemãs, francesas e italianas.
Busacca viveu
exclusivamente para o estudo. Trabalhador incansável, avesso às atividades
sociais, residindo sozinho no casarão onde também tinha seu consultório,
fechava-se na enorme biblioteca todas as tardes, ao encerrar as consultas e,
até altas horas, lia, revia casos de interesse, analisava desenhos de seus
auxiliares, redigia trabalhos. Os poucos colegas que com ele estudavam, eram
submetidos ao mesmo regime. Não admitia falha de interpretação e muito menos de
observação.
Orientou trabalhos
de oftalmologistas de todo o Brasil, esclareceu dúvidas de quantos o
procuraram, mas não fez continuadores.
Momentos antes de
sua morte, no Hospital da Escola que ajudou a fundar, o Dr. Renato de Toledo
foi, atendendo a recomendação expressa em carta por ele entregue a seu
advogado, examinar suas córneas, que deixaria para que o Banco de Córneas de
São Paulo as transplantasse em dois pacientes por ele indicados.
Conforme relato do
Dr. Renato de Toledo: “Examinei, comovido, aqueles olhos sem vida, que durante
sessenta anos esmiuçaram outros, e que, por sua vontade, num nobre gesto,
continuariam a ajudar a ver”.
Ainda informações
adicionais sobre Archimede Busacca foram prestadas por Durval Livramento do
Prado a Ribeiro do Valle:
Busacca nasceu em
Basico, Messina, na Itália, em 27 de janeiro de 1893 e diplomou-se em medicina
pela Universidade de Palermo, em 1916, como aluno brilhante. Foi assistente do
Instituto Anatômico de Palermo e adjunto de várias clínicas oftalmológicas
universitárias. Recebeu a Cruz de Guerra por serviços prestados durante a
Primeira Guerra. Em 1926 conquistou o título de Livre Docente de Clínica
Oculística e honroso parecer da comissão examinadora. Seus Elements de Gonioscopie Normale, Pathologique et Experimentale foram
publicados em São Paulo, em 1945, pela Tipografia Rossolillo; os 3 volumes da Biomicroscopie et Histopathologie de l’Oeil,
em Zurich; a Biomicroscopie du Corps
Vitre et du Fond de l’Oeil, por Masson et Cie., em Paris, em 1957 e o Manuel de Biomicroscopie Oculaire também
em Paris, em 1966, por Doin-Deren et Cie.
Antes de morrer,
doou seus olhos a dois de seus clientes mais pobres, um olho para cada um, aos
quais somente um transplante de córnea poderia lhes devolver a visão. A
operação foi efetuada pela Sociedade Banco de Olhos do Estado de São Paulo, em
São Paulo, com amplos resultados para os dois pacientes.
Faleceu Busacca em
São Paulo em março de 1971.
Referência bibliográfica:
Toledo, R. – Archimede Busacca (1893-1971) in A Escola Paulista de Medicina – Dados
Comemorativos de seu 40º Aniversário (1933-1973) e Anotações Recentes.
Organizado por José Ribeiro do Valle. Empresa Gráfica Revista dos Tribunais,
1977, páginas 46-49.
Bom dia
ResponderExcluirTive a oportunidade de ser atendido por esse brilhante médico.quando jovem.
Italiano de voz áspera mas muito dedicado a profissão.
Com uma atitude humanitária suas córneas foram doadas aos mais necessitados.
Lindo gesto
Deve estar no mundo espiritual prestando auxílio aos filhos de Deus.
Obrigado
ResponderExcluirFui atendido por ele em 1964, era estudante de medicina na santa casa, nao cobrou, a consulta, consultorio em um casarão da brigadeiro luiz antonio, já era um senhor, mas em otima forma. Não esqueço tambem de sua assistente, uma sra japoneza que trocava as lentes sob seu comando
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