domingo, 16 de setembro de 2018

Biografia de Flávio Oliveira Ribeiro da Fonseca


A partir de texto de Carlos da Silva Lacaz

     Flávio Fonseca nasceu na cidade do Rio de Janeiro, a 12 de setembro de 1900. Diplomou-se em 1923 pela Faculdade Nacional de Medicina, radicando-se em São Paulo desde 1926.
     Fez concurso (que foi anulado) de língua e literatura alemã do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, onde defendeu a tese – “Considerações de ordem lexicológica sobre o substantivo alemão”, em concurso para Catedrático. Formou-se pela Aliança Francesa e falava fluentemente o francês, o inglês e o alemão. Interessado em corresponder-se com colegas da União Soviética e da Holanda, aprendeu também o russo e o holandês.
     Dedicava-se também à caça, de onde trazia os ácaros necessários às suas pesquisas no Butantã.
     Especializou-se em Parasitologia e Zoologia Médica, trabalhando ativamente nos laboratórios do Instituto Oswaldo Cruz. Em 1925 percorreu, em viagens de estudos, os sertões de Mato Grosso e as florestas da Bolívia, como médico, durante as construções da Estrada de Ferro Transcontinental Brasil-Bolívia.
     Em 1926, veio substituir, na Faculdade de Medicina de São Paulo, o catedrático de Microbiologia e Imunologia e aí lecionou até 1931. Neste ano vinculou-se ao Instituto Butantã, chefiando a Seção de Parasitologia.
     A partir de 1933, ocupou a Cátedra de Parasitologia da Escola Paulista de Medicina, da qual foi um dos fundadores, nas primeiras reuniões realizadas à rua Oscar Porto, a 1 de junho de 1933.
     Na Escola Paulista de Medicina fez parte do Conselho Técnico Administrativo e paraninfou uma de suas turmas.
     Diretor do Instituto Butantã por sete vezes, tornou-se grande especialista em acarologia, descrevendo numerosos ácaros parasitas de vertebrados da América do Sul.
     Deixou no Instituto Butantã cerca de oitenta mil exemplares de ácaros, sendo, provavelmente, uma das maiores coleções do mundo. Além de inúmeros trabalhos versando sobre ácaros, publicou vários outros sobre protozoários, entomologia médica, riquetsioses, etc.
     Manteve correspondência com acarologistas das Américas e da Europa.
     Descreveu diversas espécies novas de protozoários, entre os quais o Plasmodium simium, de primatas. Eleva-se a 130 0 número de trabalhos que publicou, além de magnífica e importante monografia sobre “Animais Peçonhentos” (Butantã, 1949).
     Como Diretor do Instituto Butantã obteve bolsas para diversos pesquisadores brasileiros na Europa e Estados Unidos; e do exterior trouxe também pesquisadores para estágio e pesquisa.
     Fundador da Sociedade Brasileira de Entomologia, do Clube Zoológico e do Parque Zoológico de São Paulo, era membro da Royal Society of Entomology de Londres, bem como da Sociedade Brasileira de Biologia e do Comitê Internacional da Review of Acarology.
     Nos seus trabalhos sobre malária, confirmou a hipótese da importância exercida pelos anofelinos do gênero Kerteszia na transmissão daquela protozoose nas matas e serras, o que por mais de 40 anos fora posta em dúvida. Flávio da Fonseca colaborou, igualmente, na luta antimalárica, tendo chefiado o Serviço de Profilaxia da Malária de São Paulo, nele introduzindo em 1946 o emprego do DDT e de medicamentos sintéticos modernos.
     No Instituto Butantã, aperfeiçoou as técnicas de preparo do soro antitetânico e de outros produtos imunoterápicos.
     Na Revolução Constitucionalista de 1932 foi comissionado como oficial médico, inspecionando as frentes de batalha em companhia de seu sogro, Eloy Lessa, diretor médico do Serviço Sanitário da Secretaria da Saúde.
     Por ocasião da comemoração do Quarto Centenário da Cidade de São Paulo recebeu do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo a medalha da Imperatriz Leopoldina, por trabalho apresentado e então publicado em volume São Paulo em Quatro Séculos, contendo outros trabalhos sobre diversos ramos de atividade, de cientistas e historiadores.
     Membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, apresentou em suas reuniões anuais diversos trabalhos científicos. Contribuiu em duas edições do livro “Atualização Terapêutica” com trabalhos de sua especialidade. Tomou parte em Bancas Examinadoras para o preenchimento de cátedras de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia.
     A medicina era tradição de sua família. Seu pai foi secretário perpétuo da Academia Nacional de Medicina, seu irmão, Olympio da Fonseca Filho (1895-1978) era parasitologista consagrado, tendo sido Diretor do Instituto Oswaldo Cruz, do Instituto de Pesquisa da Amazônia e da Faculdade de Medicina da Praia Vermelha.
     O Prof. Flávio da Fonseca faleceu em São Paulo, no dia 22 de maio de 1963, aos 62 anos. Ocupando numerosos cargos de relevo, foi grande técnico, professor e administrador, com trabalhos científicos de repercussão internacional.

Fontes bibliográficas:
Lacaz, C.S. – Flávio Oliveira Ribeiro da Fonseca (1900-1963) in A Escola Paulista de Medicina – Dados Comemorativos de seu 40º aniversário (1933-1973) e Anotações Recentes. Organizado por José Ribeiro do Valle. Editora Empresa Gráfica da Revista dos Tribunais, 1977, págs. 82-85.
Entrevista com Olympio da Fonseca Filho acessado em
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/historia-oral/entrevista
tematica/olympio-da-fonseca

domingo, 2 de setembro de 2018

Biografia de Felipe Figliolini


Baseado no texto de Edgard Braga: Retrato de um Médico.

     Felipe Figliolini nasceu em São Paulo a 3 de setembro de 1896, filho de José e Rosa Figliolini, ambos nascidos na Itália e naturalizados brasileiros. O pai, arquiteto, executou de vulto na cidade de São Paulo, inclusive como colaborador de Ramos de Azevedo. Felipe Figliolini casou-se em 1919 com Ada Franzoi. O filho mais velho, Felipe José Figliolini também é médico e segue sua especialidade.
     Felipe Figliolini fez parte de um grupo de estudantes que iniciou o Curso Médico na primeira, assim chamada, Universidade de São Paulo (também conhecida na história como “uspinha”), que existiu entre os anos de 1911 e 1917, e era uma Universidade privada. Com o fechamento dessa Universidade, esse grupo a que pertencia Figliolini foi aceito pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Consta que ele, antes disso, era bacharel em Ciências e Letras, tendo recebido uma medalha de prata do Ginásio Ítalo-Brasileiro em 1911, por seu desempenho nessa área.
     Em 1920, por concurso, passou em primeiro lugar para ser Interno de Clínica Propedêutica, cadeira essa dirigida pelo Prof. J. Rocha Vaz. Nesse Internato teve como colegas: Carlos Büller Souto, Couto e Silva, Lourenço Jorge, os irmãos Burgos, J. Ferreira de Andrade, Berardinelli e Capriglione, entre outros. Nesse período Felipe Figliolini foi assistente da Cadeira de Higiene, na Escola Superior de Agricultura e frequentou o Instituto Oswaldo Cruz, em Manguinhos. Em 1921, publicou no Brasil Médico trabalho intitulado “Abscesso Amebiano do Fígado”.
     Em 1922, Felipe Figliolini formou-se com a tese de doutoramento sobre “Semiótica das Icterícias”, aprovada com distinção. Não era muito o que se sabia sobre o contágio e a evolução da moléstia, apontada por clínicos como “afecção catarral” a partir de mestres franceses, com localização obstrutiva na vesícula biliar. A tese colaborou na abordagem semiológica hepática, especialmente em diagnósticos diferenciais. A partir daí, Felipe Figliolini interessou-se pelas moléstias do campo que era designado como “Aparelho Digestivo e Nutrição”.
     Em 1923, em São Paulo, passou a ser assistente voluntário da Cadeira de Clínica Médica comandada por Ovídio Pires de Campos até 1930. Figliolini publicou, juntamente com Felício Cintra do Prado, o trabalho “Síndrome de Brown-Sequard”. Publicou também trabalhos tidos como pioneiros em nosso meio: “Tratamento de Hemorroidas por injeções esclerosantes”, “Considerações sobre o tratamento médico das hemorroidas”, “Dois casos de icterícia dissociada na litíase biliar”. Publicou ainda mais 25 estudos médicos, muitos em parceria com Felício Cintra do Prado, alguns em língua alemã, além de conferências e palestras nas sociedades científicas e na Escola Paulista de Medicina, onde era catedrático.
     Conforme Edgard Braga, a década de 1920 foi de grande abertura médica para assistência e pesquisa, com grande combate à tuberculose, à hanseníase e mais pesquisas sobre a doença de Chagas. Com esse movimento, Felipe Figliolini também foi assistente voluntário na Policlínica de São Paulo.  
     Em 1933, Octavio de Carvalho, ao criar a Escola Paulista de Medicina, buscou Felipe Figliolini para comandar a Cátedra de “Moléstias do Aparelho Digestivo e Nutrição”.
     Figliolini publicou ainda vários trabalhos em colaboração com Felício Cintra do Prado e Evaldo Foz, em torno de pré-câncer gástrico, sífilis, colites ulcerativas, entre outros. Foi Vice-Presidente da Associação Paulista de Medicina e, por duas vezes, Vice-Diretor da Escola Paulista de Medicina, tendo também pertencido ao seu Conselho Técnico Administrativo.
     Conforme o texto de Edgard Braga, redigido entre 1973 e 1977, Felipe Figliolini estava aposentado dedicando-se à pecuária no Pantanal do Mato Grosso.
     Felipe Figliolini faleceu em São Paulo em julho de 1977, aos 81 anos de idade. Foi sepultado no cemitério do Araçá. Existe rua em Santo Amaro, São Paulo, com o seu nome.
     Acrescentamos interessante texto de Edgard Braga em sua biografia de Felipe Figliolini, dos anos 1970, onde ele procura reforçar Figliolini como Mestre:
     “A palavra mestre vem sofrendo contínuo desgaste, principalmente hoje, sobretudo no setor educacional, onde o estudante, acomodado à balbúrdia que há no aprendizado e ensino, prescinde do explicador, do professor, isto é, do mestre. Caminha o mundo para se transformar, através dos veículos de massa média, numa aldeia global, segundo insinua MacLuhan. O ensino é transmitido em testes de quadrinhos; assim também as provas de exame, e os ‘mestres de hoje’ vão às aulas munidos de apontamentos copiados dos tratadistas, muita vez sem qualquer relação com o assunto em foco. São os chamados ‘ficheiros ambulantes’, frios e incomunicantes... O Mestre, porém, (M maiúsculo) era, e creio ainda é, a figura ungida de gravidade e que sabe transmitir a matéria aprendida há longos anos em porfioso labor. É um título humanístico que o distingue dos demais homens, oriundo nas democracias, como disse Condorcet, do aprimoramento educacional”.

Fontes bibliográficas:

Braga, E. - Felipe Figliolini - Retrato de um Médico in A Escola Paulista de Medicina - Dados Comemorativos de seu 40º Aniversário (1933-1973) e Anotações Recentes. Empresa Gráfica da Revista dos Tribunais, 1977, pags. 76-81. 

Dicionário de Ruas de São Paulo. Acessado em
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/arquivo_historico/noticias/?p=9808